domingo, 30 de junho de 2013

Árvore Bonsai

Desde pequeno que me dizem para ser alguém.
Desde pequeno que tento saber o que é isso de ser alguém.

Desde pequeno que me dizem que o meu futuro será brilhante se tiver um canudo debaixo do braço. "Ah, o belo do certificado que nos torna alguém!" pensei eu, já com uns copos a mais. Enganei-me. Não tanto no conteúdo dos ditos copos, mas sim na súbita epifania.

Ser alguém não é ter um canudo. Mas se pensarmos nisso, o canudo no sentido verdadeiro da palavra é feito de cartão, que por sua vez é feito de papel, que por sua vez vem das árvores. Então, um canudo até ser canudo passa por várias fases da sua efémera vida. Será que também sonha em quem foi numa vida passada? Ou em quem será numa vida futura? Não tem forma de saber que já foi uma árvore.

Ele não, mas em Portugal, somos árvores bonsai. Daquelas árvores miniatura, que nunca crescem em tamanho e vivem constantemente apavoradas a tentar garantir a sobrevivência. Não crescem porque há sempre alguém a cortar-lhes as raízes principais. A árvore bonsai oferece-se, é uma prendinha que se dá no Natal, que se guarda no escritório. "Oh, tão gira" diria a nossa tia do bibe cinzento.

Nós somos árvores bonsai.

Quando achamos que somos alguém porque temos um canudo, cortam-nos as raízes.
Quando percebemos que não é o canudo que faz de nós gente, continuamos de raízes cortadas.
Quando achamos que estamos na melhor fase da nossa vida e que temos o mundo pela frente, cortam-nos as raízes.
E vamos continuar aqui.
Nunca faremos parte de um pomar, nunca daremos pólen às abelhas.
Não enquanto nos cortarem as raízes.

domingo, 23 de junho de 2013

Desconhecidos

Não admites mas conforto é o que mais queres na vida. Tens medo de morrer sozinho e nem a garrafa vazia espelha a solidão com que tens de viver todos os dias. Não acendes a chama em ninguém, não aqueces nem confortas o suficiente. As baladas que cantas não encantam musas inspiradoras e as que ouves afastam-nas.

Todos querem alguém que os aqueça durante a noite e que os faça suspirar de alívio quando a desgraça assola o mundo. A estabilidade perfeita de alguém que aprendemos a amar porque nos dá jeito e é cómodo. As noites frias depressa se aquecem, o frio deixa de rasgar a pele quando espreitas de uma ravina. A ganância está em termos de onde beber e ainda assim, querermos um melhor vinho.

Assinam-se os termos e condições a que ninguém presta atenção. Eu aceito-te como a minha reconfortante companheira. Tu aceitas-me como o teu porto seguro. E ficamos assim, descrentes um no outro, desconhecidos.